REBIMBA O MALHO

REBIMBA O MALHO

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

OS REIS MAGOS

OS REIS MAGOS
    
    Pensa-se que os três Rei Magos fossem sábios astrólogos e considerados Reis por serem muito poderosos e terem oferecido a Jesus presentes magníficos: ouro para honrar o Menino como Rei; incenso para o reconhecer como Deus e mirra para significar que Ele era homem verdadeiro.
     Estes magos chamaram-se:
GASPAR que significa o que vai com amor
MELCHIOR o que anda com suavidade e guia usando a mansidão
BALTAZAR o que obedece prontamente sem discutir a vontade de Deus
     O Evangelho ensina que vieram do Oriente guiados por uma estrela diferente de todas as outras e, ao seguirem-na, chegaram ao presépio onde ajoelharam e adoraram o Salvador.
     Existem muitas tradições para se comemorar o dia de Reis como ter a romã à nossa mesa e que deve ser comida tendo ouro numa das mãos. Deve-se guardar sete bagos durante todo o ano para que à família na falte dinheiro. É uma tradição não muito usual entre nós embora muito antiga noutras paragens.
     Outro costume também já antigo, calcule-se do tempo dos Reis Magos. Estes quando chegaram perto do presépio tiveram um problema: qual deles faria em primeiro lugar a oferta ao Menino? Valeu-lhes um artífice que se prontificou a confeccionar um bolo que teria a forma redonda com uma abertura no centro e enfeitado com frutos secos e cristalizados de maneira que desse a impressão serem pedras preciosas encastoadas como de uma coroa real se tratasse. Todavia, no interior colocaria uma fava. Partido e distribuído, iria em primeiro lugar aquele que fosse contemplado com ela. Não nos diz a lenda qual deles teve esse privilégio. O caso espalhou-se e foram os pasteleiros os responsáveis pela sua divulgação.
     Noutros quadrantes, outros usos existem como em Macau que nessa data respira-se um ar de festa durante vários dias e em casa alguma faltam as tangerinas quer em pratos, quer penduradas em pequenas tangerineiras envasadas visto serem consideradas o símbolo da riqueza eda prosperidade.
     Em Espanha, a festa dos Reis Magos é uma das mais importantes das festas do Natal. São os Reis que trazem os presentes para as crianças por isso, elas deixam à noite nas varandas ou janelas, cestos para as recolherem. Mais vale assim, do que acreditarem no pai natal.

CONDE DA GARDUNHA        


terça-feira, 20 de dezembro de 2011

O NATAL - CONTINUAÇÃO (AS JANEIRAS)

O NATAL - CONTINUAÇÃO (AS JANEIRAS)
As janeiras como o nome indica, são cantigas de Boas Festas por ocasião do Ano Novo também chamado Ano Bom e por conseguinte cantadas em Janeiro.
Talvez assim acontecesse ou ainda aconteça em muitas terras. Porém, onde me criei, as coisas não se passavam bem assim. As janeiras vinham muito antes, logo que o calendário perdia a folhinha do Novembro, eis que os janeireiros da minha infância, aí estavam. Eram grupos de rapazes que percorriam o lugar com suas cantigas de adular embora falando sempre do nascimento do Menino.
Enfrentavam heroicamente umas vezes o vento nordestino que impiedosamente açoitava aquela serrania assobiando lugubremente por aquelas escarpas, ou as chuvas álgidas tocadas por rajadas que encharcavam até aos ossos qualquer cristão, ou ainda, a neve que de mansinho caía lentamente cobrindo de branco aqueles caminhos sinuosos e alcantilados. Foi com razão que empreguei - heroicamente – porque na verdade, era bravo o clima por aquelas terras do fim do mundo.
Estes rapazes de rija têmpera, não vergavam por maior que fosse a borrasca. As suas vozes lá longe, ouviam-se ora mais nítidas ora mais sumidas, consoante o vento as trazia ou as levava.
Gostava deles e é com imensa saudade que os recordo. Só uma vez ouvi o “Talinca Martelos” como lá se dizia. Foi dedicado a um vizinho que tinha por hábito deixar os rapazes cantarem e recantarem sem que lhes desse a devida recompensa. Foi numa dessas noites que ouvi então:

Talinca martelos
E torna a talincar
Este barbas de chibo
Não tem nada pra nos dar.

Terminado este mimo, eis que eles aí vão numa abalada desordenada porque nunca se sabe qual a reacção de um recém-promovido a “Barbas de Chibo".   Rara era a noite que pela nossa porta não passassem dois ou três destes grupos. Assim que ouvíamos a voz do solista sabíamos logo de quem se tratava. O melhor era o Manel Serrão, aliás, todos os irmãos tinham muito jeito para as cantorias, salvo o Zé que era surdo-mudo. Mesmo assim, não obstou que numa dessas noites, na sua voz gutural louvasse o Menino Jesus juntamente com outros.

O Manel Serrão começava:
                                           “Inda” agora aqui cheguei
                                           Pus o pé nesta escada
                                           Logo o meu coração disse:
                                           Aqui mora gente honrada.

O refrão era atacado por todos:

                                           Aquela lapinha
                                           Coberta bem c’um véu
                                           A Virgem bem guardada
                                           P’los Anjos do Céu
                                           Ó Anjos do Céu
                                           Que tão bem cantais
                                           Cantai ao Menino
                                           Bendito sejais!
Continuava o Serrão:

                                           Viva lá senhor ……..
                                           Raminho de salsa crua
                                           Quando vai pró trabalho
                                           Ilumina toda a rua.
Entra o coro:
                                           Aquela lapinha
                                           Coberta…………
Vem o Serrão:
                                           De quem é aquela bola
                                           Que ali está no corredor
                                           É do menino…………
                                           Que é um grande jogador
Novamente o coro:
                                           Aquela lapinha
                                           Coberta………….
Continua o Serrão:
                                           De quem é aquele livro                                
                                           Que ali está naquela estante 
                                           É do menino…………..
                                           Que é um bom estudante.
Segue o coro:                                           
                                           Aquela lapinha  
                                           Coberta………….
Arremata o Serrão:                                           
                                           Levante-se lá minha senhora  
                                           Desse banquinho de prata  
                                           Venha dar-nos as janeiras  
                                           Q’está um frio que mata.
           
Terminada a cantiga, abria-se a porta de casa e eram gratificados com dinheiro ou com outros mimos que antes dos agradecimentos eram guardados zelosamente.

CONDE DA GARDUNHA


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

O NATAL

O NATAL



(EXCERTO EXTRAÍDO DE UM OPÚSCULO QUE ESCREVI HÁ MUITO)


O Madeiro ou Tronco também assim chamado, é trazido pelo rapazio num carro puxado por uma junta de bovídeos. Também aqui houve já uma mudança graças à evolução. Hoje os pachorrentos e simpáticos animais, foram substituídos pelo tractor que com o seu atrelado lá chega ao adro da igreja com menos demora mas, também com menos poesia.
A tradição manda que o tronco seja roubado e que se o dono tiver alguma desconfiança, finja que nada sabe e facilite a vida aos rapazes que se preparam para lhe subtrair algo que servirá para aquecer aquela noite que também por tradição deve ser fria de bater o tarau e o ambiente ficará completo, se alguns farrapos de neve esvoaçarem no espaço. Deus dê muita saúde e vida a quem já teve esse privilégio.
Muito antes da meia-noite, já as pessoas começam a abandonar os seus lares com destino ao adro da igreja onde se encontra o madeiro. Vêm encapotadas, golas bem puxadas para cima enquanto as boinas ou chapéus bem chegados para as orelhas. As mãos, quando não estão bem no fundo dos bolsos, friccionam-se uma na outra ou bafejam-se para que os dedos não fiquem encaramelados. Os narizes por via de regra, estão vermelhos devido ao ar gélido que os fustiga. O pingo que teima em aparecer, logo desaparece numa fungadela e então é o aparece e desaparece até que, acaba por morrer nas costas da mão.
O povo vai chegando e vai ficando em redor do madeiro já esbraseado. O adro está enrubescido pelas línguas de fogo que numa dança voluptuosa, vão lambendo como a querer acariciar e, aos poucos, vão tomando posse do madeiro.
Enquanto os olhares estão presos naquele bailar das chamas acompanhadas de vez em quando de miríades de faúlhas, esticam-se os braços e aquecem-se as mãos ao mesmo tempo que batem os pés no lajedo ou no chão térreo.
Depois vem a dança da garrafa da aguardente que rodopia de mão em mão, ou para melhor dizer, de boca em boca e, no final de cada emborcação, segue-se sempre um aaahhhh!!!!  ou um estalido com a língua que ela é da rija.
Os corpos vão estando com boa temperatura tanto por dentro como por fora. As conversas animam-se, a risada fácil aparece e não tarda que alguém comece a cantar bem alto loas ao Deus Menino, logo seguido por todos    
                 
                 Alegrem-se os Céus e a terra
                 Cantemos com alegria
                 Já nasceu o Deus Menino
                 Filho da Virgem Maria

                 Ó meu Menino Jesus                
                 Ó meu menino tão belo          
                 Logo vieste nascer
                 Na noite do caramelo.                   

Entretanto a meia-noite chegou e o sino da igreja faz o convite para a Santa Missa, chamada a Missa do Galo, que a maior parte das pessoas se apressam a participar.
Gostei sempre de estar presente nessa Missa talvez por ser celebrada àquela hora ou simplesmente pela magia daquela noite.
A Missa do Galo era fértil em peripécias, era mesmo difícil conter o riso em certos momentos. Não eram cenas maldosas nem carecidas de respeito, se elas aconteciam, a culpa era da alegria contida nos corações estimulada porventura pela bebida ingerida à volta da fogueira. Contudo, se havia alguém mais sisudo e fizesse o respectivo reparo, imediatamente o prevaricador afivelava o rosto com o ar mais seráfico possível o que dava azo a uma maior vontade de rir.
Do que estava sempre à espera, era dos cânticos em louvor ao Menino. Enquanto as fieis devotas chegavam ao fim do cântico em tempo devido, outros fiéis devotos iam ainda aí pelo meio. O hino saía numa cadência lenta embalado em hálitos etílicos e o resto do pessoal, pacientemente, esperava que a última voz penosamente chegasse ao final.
O que de facto tinha maior relevância era que todos louvavam e festejavam o nascimento de Jesus, fosse em compasso binário ou quaternário.
Nesta Missa por hábito, dá-se a beijar a imagem de Jesus e eu, menino de Capela-mor, ia observando todo aquele cerimonial. Os fiéis subiam pela coxia central e desciam pelas laterais. Enquanto uns beijavam a uns centímetros da imagem, havia no entanto outros principalmente os mais idosos que de lábios arrepanhados pela ausência dos dentes, beijavam ali mesmo, de chapa, aquele corpinho róseo que era um regalo. Saía um beijo sonoro como a quererem mostrar ao Redentor o quanto gostavam Dele.
Depois de ouvida a missa, agrupavam-se de novo em redor do brasido em franco e alegre convívio.
Na maioria dos lares a ceia estava à espera. Era a consoada. Importava pois fazer jus ao trabalho das mulheres que não se poupavam em confeccionar os pitéus tradicionais desta festa.


(CONTINUA)


CONDE DA GARDUNHA          

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

APAIXONADO POR UM OLHAR

APAIXONADO POR UM OLHAR
       
Todos os Sábados e durante anos fazia um percurso que me dava imenso prazer.
Depois de tomar o pequeno-almoço na Brasileira no Chiado, fazia uma ronda pelas livrarias. Visitava primeiro a Sá da Costa onde me extasiava com a profusão de livros empilhados em enormes mesas bem como nas vastas prateleiras. Depois de me inteirar das novidades, seguia para a Bertrand, Aqui, detinha-me mais um pouco por via de um pequeno recanto onde estão uma mesa e duas cadeiras envolvidas por prateleiras contendo somente livros escritos por um senhor pelo qual tenho uma particular simpatia. Trata-se do Aquilino Ribeiro o homem da Grande Casa de Romarigães, Volfrâmio, Maria Benigna, Terras do Demo e de tantas outras obras que deliciam os amantes da boa leitura. Era neste recanto, que o escritor se sentava para ler ou simplesmente conversar com algum amigo que aparecesse.
Quase sempre roçava com os dedos as lombadas daquelas fiadas de livros como sinal de respeito e admiração.
Retomava a minha peregrinação descendo a Rua Garrett virando depois para a Rua do Carmo. Entrava na Portugal e, finalmente na Lello, onde permanecia mais tempo por virtude da amizade que me unia ao encarregado da livraria.
Porém, antes de transpor a porta, tinha como quase a obrigação de parar defronte a uma velhinha que encostada à parede e sentada no passeio estendia a sua mão trémula a quem passava. Por abrigo, tinha um xale preto pela cabeça que usava tanto no Verão como no Inverno.
Mas, é nesta estação do ano que os deserdados da sorte mais sofrem. Aquela velhinha apanhava a chuva por vezes gélida impelida pelo vento agreste que fazia tremer o mais agasalhado e, aquele ser frágil, no ocaso da vida, tendo só a cobri-la um frágil abafo que tantas vezes o vi ensopado. Tanto sacrifício, tão mal tratada, para no fim do dia, levar para casa umas escassas moedas.
Condoía-me aquele ser em particular e, todos os Sábados, dava-lhe com o maior prazer prazer uma nota previamente dobrada em quatro que lhe metia na mão esquálida. Nunca lhe ouvi uma palavra de agradecimento nem disso estava à espera. Agradecia-me de outra forma: levantando para mim os seus olhos lindos cor do céu e olhavam-me tão meigos e tão ternos que o agradecido era eu. Retribuía-me em dobro.
Gostava muito da minha velhinha de olhar doce que durante anos me habituara a receber dela a esmola daquele olhar.
Num Sábado de Verão, não a encontrei no seu lugar habitual. Estranhei muito a sua ausência sem que no entanto tivesse pensado o pior. Na vez seguinte, a pessoa do olhar meigo continuava ausente. Entrei na livraria e mal tinha pegado num livro, oiço nas minhas costas alguém chamando: - senhor! Quando me voltei vi um homem magro de cor macilenta mostrando querer falar comigo. A um empregado zeloso que vinha já pronto a evitar que eu fosse incomodado, fiz-lhe sinal para que não se intrometesse. Virei-me para o homem e perguntei o que desejava. Este ser visivelmente abatido com aspecto de doente, começou por falar de cabeça baixa e um pouco titubeante. - O senhor não me conhece, mas eu habituei-me a vê-lo todos os sábados a dar esmola à minha mãe. Também eu sou um pobre e pedia no passeio oposto. Prevendo o que tinha acontecido, mesmo assim, perguntei por ela. A resposta veio numa só palavra: morreu! Fiquei momentâneamente em silêncio. O homem prosseguiu: - Com a esmola que o senhor dava, servia para pagarmos a renda da nosso pobre casa e para mais alguma coisa. A minha mãe era muda mas soube dizer-me que era o senhor o seu bem-feitor. Um nó na garganta impedia que eu mantivesse o diálogo. A minha velhinha de olhar lindo era muda. Nunca o suspeitara.
Ainda mal recomposto, perguntei se não podia trabalhar. Baixou os olhos e confessou: - trabalhei na construção civil até que fui apanhado pela tuberculose. Estive internado num sanatório durante muito tempo. Quando saí, fui ao meu antigo trabalho mas não me aceitaram. Percorri tudo pedindo por favor que me dessem algo para fazer a fim de fazer face ao meu sustento e ao sustento da minha mãe mas, tudo foi em vão. A única coisa que me restava era pedir esmola e é o que faço.
Com o coração oprimido e cheio de raiva a esta sociedade ignóbil onde estamos inseridos, voltei-me ligeiramente de lado, dobrei a nota como fazia sempre com a mãe e ofereci-lha dizendo: - obrigado por me contar a vossa história. É uma história que me comoveu e mais, por nunca ter abandonado a sua mãe, pessoa que me prendeu desde o primeiro dia que a vi. Não sabia que era muda mas essa falta, era suprimida pelo seu lindo olhar que me fascinava. Em memória dela pode o meu amigo contar igualmente com o mesmo contributo para que de algum modo possa mitigar um pouco as suas carências.
Despediu-se de mim com os olhos marejados e um pouco à pressa como que envergonhado.
Dei graças por poder continuar a ajudar um ser que fora dado ao mundo por alguém que jamais esquecerei.
Já de regresso, sobraçando uma data de livros, ocorreu-me este pensamento: quem sabe se Deus não se serviu de mim, para minorar um pouco a pobreza destas suas duas criaturas. 

Conde da Gardunha



quinta-feira, 7 de julho de 2011

A MORTE FICOU-LHE A MATAR - (ÚLTIMO CAPÍTULO)

     A MORTE FICOU-LHE A MATAR - (ÚLTIMO CAPÍTULO)     
         
        Chegou o padre Manuel de sobrepeliz, estola roxa e, nas mãos, o livrinho das orações e o terço do rosário. O padre Manuel, homem alto e nédio vinha acolitado pelo Falhinho que levava presa numa das mãos a caldeirinha da água benta com o respectivo hissope e na outra mão a campainha presa pelo badalo não fosse ela tocar a destempo. O Falhinho de cabelo cor da seara pronta a ser segada, era um pobre rapaz que tinha por hábito de se servir da manga do casaco puído, para limpar as ventas mucosas. Na falta de mangas, usava a costa da mão que por sua vez ia direita à perna das calças.
         O padre Manuel aproximou-se e, parou aos pés da defunta. Depois de uma breve oração, ripou do hissope bem ensopado que o Falhinho atento lhe facilitou.
         - É a última auga que tchupas – disse o acólito. Mas, não foi assim. O padre no momento de aspergir, dá de caras com a felicidade da morta e, é com um solavanco, por querer reprimir o riso, que a água benta passa a rasar o corpo da menina Efigénia e vai pespegar-se na cabeça descabelada do Evaristo que estava sentado à cabeceira da falecida.
         Ora, o Evaristo, homem bilioso, tomou aquele desconchavo como uma afronta. Levantou-se impetuoso para ripostar mas, refreou-se quando viu estampada na cara do eclesiástico a aflição e um pedido de desculpas feito através de uma pequena vénia. Desta forma, deu-se por desafrontado. Sentou-se, puxou do lenço listrado e, ao mesmo tempo que enxugava a calva, ia murmurando: - Tiveste que te agatchar, filho de quatro nalgas.
         Sanado este incidente, os presentes aconchegaram-se para fazerem um lugarzinho para o senhor prior. O Falhinho colou-se à sua ilharga não largando por nada as suas alfaias.
         Iniciou-se a recitação do terço e, quando já iam dedilhadas quatro dezenas, apareceu a Maria Sem Pescoço uma das protegidas da que foi sempre menina. Não se incomodando com a toada da reza, disse em voz alta o que lhe ia na alma: - Atão menina Fgénia, deitxou-nos assim sem mais nem outra; coitadinha, tão boa, tão santa, era o que se pode chamar um anjo. Merecia inté que Nosso Senhor lhe tivesse posto umas asinhas presas nas costas.
         O Falhinho que tinha os olhos e ouvidos lampeiros, não se conteve. Com as fuças emolduradas por um sorriso alarve que deixava à mira duas dentolas intimadoras e capazes de traçar um bom naco de broa em menos de uma Avé Maria, ripostou: - As asas fetchou-as e entalou-as debaitcho do…
O Perna D’Aço que não era para brincadeiras e que ultimamente andava com os azeites por ter que usar um colete ortopédico a fim de lhe endireitar o espinhaço, evitou que saísse asneira. Estando atrás do Falhinho, sentenciou-lhe: - Cala-te cabrão! Se falas no cu da velha, arranco-te das patas a caldeira das benzeduras e dou-te com ela tantas vezes, até te ratchar esses cornos.
         O coitado do rapaz, de corado se fez verde passando pelo amarelo e, até a caldeirinha tremelicou.
         Mas, a Ti Rabeia das Virtudes que além de ser vendedeira, boa alma, e apaziguadora das excitações do rapazio do lugar, ouviu a reprimenda e advogou: - Parece impossível! Ora agora mai esta, ficava o rapaz, coitadinho, ratchado e mal pago, só por ter a alembrança de dizer onde a menina poderia ter as asas.
         O Perna D’Aço ia a ripostar se não fosse a pronta intervenção do padre Manuel que para isso deixou em meio um Pai Nosso: - Então, haja mais compostura, honremos e respeitemos quem partiu desta vida.
         Assim se pazearam os ânimos. O terço terminou e como era chegada a hora, começaram a preparar a menina Efigénia, para ser levada à última morada que distava uma meia hora em passo cadenciado.
         À porta, já esperavam três irmãos das almas com o respectivo estandarte. Eram eles o Colhouço que era o porta-estandarte, a ladearem-no segurando nos cordões estavam o Zé Panaita ainda arrimado à sua muleta e o Ti Manel João, tendeiro.
         Não haveria nada de peculiar nestas três personagens, se não tivessem em comum, o mesmo defeito físico: todos eles eram coxos mas, coxos a valer. O mais torto, o que mais se evidenciava, era o Ti Manel João que a cada passada ao apoiar-se na perna manca, dava mesmo a ideia que ia ruir.
         O cortejo fúnebre organizou-se: na vanguarda ia o Falhinho que fazia vibrar a sineta a cada pé de passada, ao mesmo tempo que pontapeava todo o seixo reboludo que estivesse ao alcance das suas botas de ver o sebo, brochadas e com a biqueira empinada a espreitar o Céu. Seguia-se-lhe o padre que orientava as orações durante o percurso. A irmandade depois e, antes dos acompanhantes, o féretro. Este, segundo o hábito naquela aldeia, era transportado numa carreta e o caixão ia destapado para que o povo pudesse pela última vez, ver a face do irmão que partira.
         O estandarte das almas, lá ia adejando numa louca tormenta sacudido impiedosamente pelos sacões descoordenados transmitidos pelos três chanquetas.
         Quem não despregava os olhos da bandeira, era o Rebola Caixotes que se destacava pela sua gaforina em remoinho e a carcela das calças por abotoar de onde assomava timidamente parte das ceroulas de flanela. Às tantas, não se conteve e vaticinou para o Redolho com um ar assacanado: - Cá para mim, aqueles cotchambetas dum catano, ainda fazem com que as almas se despeguem da bandeira e venham sacudidas por’i abaitcho afocinhando no tchão. Enquanto o Redolho ria a bom rir com o dichote pondo às escâncaras os dentes irregulares e que o tempo se encarregara de os forrar com uma cor fuliginosa. O Palpito, criatura possante e de farta trunfa, estava por perto e teve que dizer das suas: - Merecias que te fosse às ventas seu filho da puta. Já não há respeito nem num acto destes?
         O Redolho bem como o Rebola Caixotes acharam por bem não retorquir tanto mais, que viram como ao Palpito lhe fremiam as aletas do apêndice nasal e quando isto acontecia era sinal que estava prestes a soltar o seu génio violento.
         De ambos os lados da estrada, estavam muitos populares que não se tinham incorporado no préstito que lá caminhava às vezes por caminhos acidentados. Tanto assim, que o corpo da menina Efigénia com os solavancos até parecia ter movimento próprio.
         Atento àquele quadro, estava o Chico Caixa vestido como sempre à cáboi: chapéu de abas reviradas, calças afuniladas e botas mexicanas de tacão alto favorecendo-o em altura. Era também anti-simpatia, anti-clerical, anti-religioso, enfim, era um anti a tempo inteiro. Deu-se até o caso que num Domingo de Desobriga, quando alguns bons católicos que estavam, depois de terem cumprido o seu dever, a beberricar na taberna do Ti Manel da Ribeira estar ele também presente. Não é que o safado se vira para o Amândio Bexiga, no momento preciso em que ele emborcou de um trago um cálice de bagaço que sem rebuço, atira-lhe esta anormalidade: - Tão, já estás a afogá-LO?
         Os presentes, somente sorriram, não, que eles eram tementes e acharam melhor terem em conta o velho axioma: “Muitas graças a Deus e poucas graças com Deus”.
         Pois o nosso figurante, no alto dos seus tacões, movimentando um palito de fósforo que prendera na boca e com os olhos fisgados no caixão, gracejou: - Fico sem saber se a velha se abana por rir ou se ri por ser abanada. Os que estavam à sua beira e que eram da sua laia, deliraram, ficando toda aquela ala à beira caminho parada, bem-disposta e chalaceira.
         Já a carreta tinha ultrapassado o largo portão de ferro do jardim das cruzes e ainda se ouvia o gargalhar daquelas almas danadas sem temor a nada e a ninguém.
         - São uns ímpios, uns excomungados refilava a Ti Panchorra, virando a cabeça para donde vinha o som daquele despropósito.
         Quem esperava encostado à sachola, era o Ti Manel Pilatos, elevado à categoria de coveiro interino, já que o efectivo, o Ti Chanfana andava às voltas com um cobrão que o trazia derreado.
         Quando abeiraram o caixão, o Ti Pilatos descobriu-se metendo a boina no bolso traseiro das calças coçadas. O padre Manuel, fez a última oração e, de seguida, então sim, a menina Efigénia recebeu a última água.
         Fechado o sobretudo de pinho, foi este acomodado no fundo da cova com a ajuda de alguns populares.
         O Ti Pilatos debitou o seguinte comentário ao mesmo tempo que arremessava os olhos piscos e vermelhuscos que enxugava constantemente com o lenço tabaqueiro amarfanhado e enxovalhado, para o fundo da cova: - Para quem não é da arte, até ficou um trabalho asseado. O talhe como convém, foi mesmo à justinha. Desejo que a menina F’génia, conserve no Céu o mesmo sorriso com que se foi da terra. Isto, dito ao jeito do Ti Pilatos, fez com que os mais próximos, o padre Manuel incluído, retivessem a custo o sorriso.
         Só quando se ouviu o som cavo da terra a bater no tampo da urna, é que o povo debandou.
         Já o coveiro interino dava os últimos aconchegos à terra, quando o sino se calou.
         - C’um raio, até me pareceu que a porra do sino em vez de dobrar, tocava à Aleluia. Hum! Se calhar fui eu que não me atentei bem.
         Ia já de abalada, levando nos lábios um Pai Nosso, ao ombro a sachola e, com o lenço tabaqueiro limpando os olhos, ainda se voltou, a fim de ver como tinha ficado catita a última morada da menina Efigénia.

Conde da Gardunha

quarta-feira, 6 de julho de 2011

A MORTE FICOU-LHE A MATAR (INTRODUÇÃO)

 A MORTE FICOU-LHE A MATAR (INTRODUÇÃO)                                                                        
       Há já alguns anos escrevi uma novela e, resolvi agora, transcrever o último capítulo já que contar toda a história poderia eventualmente tornar-se enfadonho. Tirando a personagem principal que é ficcionada e a localidade onde se passa a história ser mais ou menos localizada, todos os outros intervenientes existiram e faço questão de os mencionar pelas alcunhas que tinham. Também levei em conta a pronúncia do lugar e, por conseguinte, não considerem erro a ortografia
        Para entronizar os eventuais leitores nesta história resumi-la-ei em breves linhas uma vez que só será publicado o derradeiro capítulo.
        É a história da vida da menina Efigénia que foi menina até à sua morte em virtude de nunca ter casado. Não por falta de aptidão para o casamento mas, por falta de pretendentes. A menina Efigénia, beata militante mas, muito querida pelas gentes do lugar pelo seu espírito esmoler, nasceu, coitada dela, desprovida sequer de uma centelha de beleza. O que a mais desfeava eram dois  dentes da fachada quais duas sentinelas avançadas que nunca se albergavam na respectiva guarita. Era pessoa de muitos teres e haveres e que tinha por morte dos pais, herdado a mais rica casa do lugarejo
        Todos os Sábados na sua casa apalaçada havia serões onde as artes predominavam que ia do teatro à música passando inclusivamente pela dança. O promotor dos serões era o Ti Zé Loureiro que uma corda a menos na sua rabeca não lhe trazia engulhos
        Ora, foi num destes serões que a menina Efigénia - menina com quase oitenta anos – se marchou desta vida contente vítima de uma apoplexia motivada por um riso constante e convulsivo por uma piada grosseira dita pelo Ti “Questiano” já com um grão nas duas asas
        Verificado o óbito pelo físico, este por mais esforços que fizesse, não conseguiu que os músculos da rosto da defunta tomassem o seu estado natural. Foi para a cova com um ar risonho e feliz
        É pois a partir deste ponto que se inicia o último capítulo da novela.

Conde da Gardunha                                                  

terça-feira, 10 de maio de 2011

" SE" DE RUDYARD KIPLING


Se podes conservar o teu bom senso e a calma
No mundo a delirar para quem o louco és tu...
Se podes crer em ti com toda a força de alma
Quando ninguém te crê... Se vais faminto e nu,

Trilhando sem revolta um rumo solitário...
Se à torva intolerância, à negra incompreensão,
Tu podes responder subindo o teu calvário
Com lágrimas de amor e bênçãos de perdão...

Se podes dizer bem de quem te calunia...
Se dás ternura em troca aos que te dão rancor
(Mas sem a afectação de um santo que oficia
Nem pretensões de sábio a dar lições de amor)...

Se podes esperar sem fatigar a esperança...
Sonhar, mas conservar-te acima do teu sonho...
Fazer do pensamento um arco de aliança,
Entre o clarão do inferno e a luz do céu risonho...

Se podes encarar com indiferença igual
O triunfo e a derrota, eternos impostores...
Se podes ver o bem oculto em todo o mal
E resignar sorrindo o amor dos teus amores...

Se podes resistir à raiva e à vergonha
De ver envenenar as frases que disseste
E que um velhaco emprega eivadas de peçonha
Com falsas intenções que tu jamais lhe deste...

Se podes ver por terra as obras que fizeste,
Vaiadas por malsins, desorientando o povo,
E sem dizeres palavra, e sem um termo agreste,
Voltares ao principio a construir de novo...

Se puderes obrigar o coração e os músculos
A renovar um esforço há muito vacilante,
Quando no teu corpo, já afogado em crepúsculos,
Só exista a vontade a comandar avante...

Se vivendo entre o povo és virtuoso e nobre...
Se vivendo entre os vis, conservas a humildade...
Se inimigo ou amigo, o poderoso e o pobre
São iguais para ti à luz da eternidade...

Se quem conta contigo encontra mais que a conta...
Se podes empregar os sessenta segundos
Do minuto que passa em obra de tal monta
Que o minuto se espraie em séculos fecundos...

Então, ó ser sublime, o mundo inteiro é teu!
Já dominaste os reis, os tempos, os espaços!
Mas, ainda para além, um novo sol rompeu,
Abrindo o infinito ao rumo dos teus passos,

Pairando numa esfera acima deste plano.
Sem receares jamais que os erros te retomem,
Quando já nada houver em ti que seja humano,
Alegra-te meu filho, então serás um homem!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

PORTUGAL ATOLADO ( IV )

PORTUGAL ATOLADO (IV)

Eis que foi chegado o dia em que a Troika nos ditou a sentença.
O nosso primeiro, o tal incôngruo engenheiro relativo, logo se apressou vir à televisão a fim de fazer um comunicado ao país. Para dizer o quê? Simplesmente para dizer que o governo - em gestão - conseguira um bom acordo e assim, tranquilizar mais os portugueses. Era o sr. Pinto de Sousa no seu melhor, hábil em vender sonhos e, os mais incautos, os tais que continuam a acreditar nas habilidades circenses deste artista acharam que a coisa afinal não era tão má como apregoavam.
Mas, o que ele revelou foi o verso da medalha ou seja o menos mau, que não seria cortado o subsidio de férias nem tão pouco o do Natal e... "parole... parole"... virtude que todos lhe reconhecemos.
Porém, o que ele, o manhoso, sabendo que com papas e bolos se enganam os tolos, escusou-se  informar o reverso dessa mesma medalha por saber que é aqui que está o busílis deste intrincado problema que o próprio criou.
O anverso meus amigos que como já todos devem ter conhecimento está repleto de sacrifícios e para muitos de graves privações inclusive a fome.
Os portugueses regredirão ao tempo  do fim da monarquia e, principalmente aos tempos da 1º. República que foi mais uma época negativa da história deste país demasiado convulsivo.
Nas minhas crónicas com o título genérico PORTUGAL ATOLADO, dizia que esta barcaça onde todos somos marinheiros, ainda o seu casco não tinha batido no fundo, eis pois que ela para nossa desgraça, já roçou as areias e o estrondo final só se sentirá quando as medidas agora impostas pela tal Troika, começarem a fazer efeito em cada um de nós. Podem já começar a enviar felicitações ao tal sr. Sócrates Pinto de Sousa, todos aqueles que ajudaram a reelege-lo. Ele e o seu ministro das Finanças tiveram a veleidade de contribuir e acentuar a situação depauperada da nação, vendendo a dívida a retalho em praça pública com juros incomportáveis, para vergonha de todo um povo que não a deles, por já a terem perdido há muito.
Se o que agora se fez, tivesse sido feito há mais tempo, evitar-se-iam os juros altíssimos da dívida vendida, as negociações com a Troika teriam sido eventualmente feitas com mais margem de manobra, todos    nós aliviaríamos um pouco mais o jugo tormentoso que nos colocaram e, evitaríamos a chacota de que somos alvos de outros países que consideramos do terceiro mundo. Quando na Internet leio depoimentos nada abonatórios sobre Portugal e os portugueses de gentes oriundas de países onde um dia imperámos, sinto vergonha e revolta. Dá-me vontade de gritar como possesso: ERGA-SE NOVAMENTE O PATÍBULO!
No fim do ano passado, na minha última crónica, onde desejava a todos os que lêem e visitam este blog que este 2011 fosse melhor, um amigo, por sinal meu homónimo, falou em Flop e sinceramente desejei que assim fosse embora interiormente não acreditasse. Afinal, os acontecimentos deram-me razão ao dizer que este ano iria ser um ano negro para a grande maioria dos meus concidadãos.
Resta-nos viver um dia de cada vez o melhor que podermos e não deixar que o desânimo nos invada, sem deixar contudo, de incriminar e recriminar os principais responsáveis pela desgraça do nosso povo.
Por tudo o que nos está a acontecer e principalmente para os incapazes, para os malsins e prepotentes... REBIMBA O MALHO


Conde da Gardunha

terça-feira, 3 de maio de 2011

PORTUGAL ATOLADO ( III )

PORTUGAL ATOLADO ( III )

Os noticiários de ontem transmitidos pela televisão, davam-nos conta do desnorte nos serviços do Hospital dos Capuchos em Lisboa.

   A fila de pessoas era interminável e consequentemente a indignação e a revolta estava bem patente na cara de quem para ali se dirigiu às três  horas da madrugada a fim de obter uma simples marcação para, uma consulta de oftalmologia.
   Os utentes clamavam e insurgiam-se contra quem em devido tempo os tinha aliciado com promessas de melhor qualidade de vida e afinal mais não fez que contribuir para mais a degradar. Pois é, - pensei para comigo -  muitos dos que reclamam irão no dia 5 de Junho, dia das eleições, pôr o voto nesses que os enganaram. Povo que elege os mesmos que lhes causou a ruína, é um povo desprovido de discernimento, estúpido e que só tem o que merece.
    A democracia foi óptima mas, só para alguns, os privilegiados, para aqueles sabedores da arte da manigância que vão engordando as suas contas bancárias. Um dos fazedores da Abrilada já veio a terreiro confessar o seu arrependimento por se ter metido nessa aventura. De facto, ao vermos a miséria a que chegámos fruto da inabilidade de sucessivos aprendizes de política, chego a pensar se não valeria mais entregarmos este torreão a uma Troika qualquer, estrangeira que fosse, só para nos aliviarem desta canga que tão pesada nos tem sido.
    Pode eventualmente esta ideia ser polémica mas, por favor não me venham com a história da Portugalidade, do patriotismo, sentimento  que há muito perdi, graças a estes politiqueiros que tudo fizeram e fazem  para, que nem sequer assome. Quanto a isto parece-me que estamos conversados.
   E o que dizer sobre o congresso do partido do sr. Pinto de Sousa engenheiro relativo? Repararam naquele chorrilar de elogios a um fulano que mais parecia ter sido o salvador da pátria quando efectivamente foi o seu coveiro? O peru saiu dali ainda mais inchado, mais opado e mais recheado de cretinices.
    A maratona começou com um discurso gaguejado em demasia, proferido por um ancião que eu sem ter nada a ver com o que se passava estava ansioso para que o homem se despachasse o mais depressa possível por ser tão deprimente.  Este senhor, como outros tantos, não soube retirar-se a seu tempo.
    O congresso pautou pelo elogio mútuo, muitos sorrisos, pancadinhas nas costas, em suma: uma festança!
    Enquanto isso, os três "magnificos" preparavam-se para fazer o trabalho que o tão elogiado engenheiro tinha por obrigação de o ter feito só que para nossa desgraça faltou-lhe o saber e mais do que isso, faltou-lhe a humildade para ouvir os seus adversários políticos e o que eles lhe  propunham. O homem realmente é muito peco na arte da governação.
    Por tudo o que vai mal e para todos aqueles que contribuíram para este estado da nação... REBIMBA O MALHO    


Conde da Gardunha
  

terça-feira, 5 de abril de 2011

A TPM DA SENHORA DOUTORA

A TPM DA SENHORA DOUTORA

Na passada 5ª. Feira, eu e a minha mulher fomos ao Centro de Saúde a fim de fazermos a consulta anual e no seguimento as respectivas análises. Chegada a nossa vez com quase um hora de atraso, franqueámos a porta do gabinete da nossa médica de família. Até aqui, nada de anormal tirando o atraso o que, para quem anda metido nestes meandros, já nem estranha porque segundo nos informaram, está já institucionalizado.
    Sigamos pois...
    Como pessoas educadas que nos prezamos de ser, saudámos a seguidora de Esculápio que estava de encantos com o computador e fez um som gutural que o tomei como resposta. Já sentados perante a senhora facultativa levantou enfim a cabeça e perguntou à minha mulher o que havia. Esta, ainda na boa fé, lá foi abrindo o cardápio dos seus achaques procurando que lhe dessem pelos menos umas mezinhas para os item que entretanto foram acrescentados ao rol. Eu observava a senhora que continuava a passear com o rato no tapete e mal a minha mulher terminou, estava já a impressora a expedir papeis com as receitas habituais.
    Pensei para comigo: Esta médica deve estar com a TPM! Leia-se: Tensão Pré Menstrual que segundo consta altera o comportamento.
    Era agora a minha vez e a mesma pergunta; vendo o caso anterior respondi com um sorriso afivelado nos lábios: Eu? Eu não tenho nada, também só aqui vim para me passar as habituais receitas.
    Foi assim meus amigos a nossa consulta anual feita pela nossa diligente médica de família.
    Os médicos, para o serem, devem ter em primeiro lugar o sentido do dever e zelar pela saúde das pessoas que lhes estão confiadas. Bem sei que sempre tiveram um estatuto de quase intocáveis, um estatuto de  privilégio o que felizmente parece estar a mudar um pouco. Se todavia, não se sentem bem no lugar que ocupam, então nesse caso, só lhes resta procurarem outro patrão.
    Neste país nada funciona bem e em particular a saúde que é o bem mais precioso que podemos ter.
    Assim sendo, para esta dedicada médica e quejandos... Rebimba o Malho

Conde da Gardunha
   
   

sábado, 26 de março de 2011

PORTUGAL ATOLADO ( II )

PORTUGAL ATOLADO ( II )  

Então o senhor Pinto de Sousa, engenheiro relativo, lá levou com a tábua no rabo o que aliás, já devia ter acontecido há muito. Arre, que estava difícil de o homem ser apeado e ir arejar para outros horizontes. Por mim ia para a terra dele, os seus conterrâneos que o aturassem por lá e nos desamparasse a loja. Coveiro de má memória que conseguiu enterrar uma nação. É obra!
     Ontem, enchi-me de coragem e estive em frente da televisão, desde de depois do almoço até conhecer o resultado da votação. Confesso que foi uma estopada à qual resisti estoicamente.
     Valeu a pena? Direi que sim e por duas razões: a primeira para ver um loroteiro com o maior descaramento que há memória na história recente, a ter uma saída de sendeiro quando ainda há dias tinha entradas de leão. A segunda razão foi para mais acentuar o conceito que já tinha formado há muito sobre a política e os políticos.
     O que assisti ontem, deixou-me com um travo amargo e, até com asco e vergonha de todos aqueles palradores mais parecidas com as comadres desavindas e, os contribuintes a pagarem para toda aquela verborreia.
     Toda a oposição fez o papel que lhe competia e que todos esperavam. Unidos, chumbaram o documento que estava em discussão o tal Plano de Estabilidade e Crescimento  (PEC) sendo este já o nº.4 sabendo-se à partida que a  não ser viabilizado levaria à demissão de um primeiro-ministro inepto, vaidoso e autista.
     Até aqui, meus senhores apoiado! O povo consciente, aqueles que pelas circunstâncias impostas se encontram à rasca, tiram-vos o chapéu e muito reconhecidos ficam. Contudo, a oposição não se contentou somente em chumbar o documento já que entrou no campo do achincalho dardejando a torto e a direito com acusações mútuas pretendendo apurar responsabilidades.
     Ora, se o plenário tinha conhecimento de antemão qual seria o desfecho do acto pelo qual estavam reunidos, podiam – penso eu – guardar os ataques e contra ataques para os tempos próximos poupando-se assim muito tempo em falácias. Apercebi-me que os homens não perderam tempo e entraram de supetão em campanha eleitoral. Fez-me lembrar aqueles herdeiros que se agridem pela posse da herança com o morto ainda em casa.
     A bola está agora do lado do Presidente da República que tem poderes legais para jogar com algumas situações e que passam pela dissolução da Assembleia da República e convocar eleições que será a mais provável mas, também pode mantê-la e pedir ao partido mais votado o PS para nomear novo primeiro-ministro e ainda, nomear um governo presidencial.
     Em suma, a população, no caso mais provável, deverá ser chamada para votar para o fim de Maio ou princípio de Junho.
     Bem, como deixou o país o agora demissionário Zé Pinto de Sousa? Não esquecendo todavia, 0 seu ministro das Finanças porque este, também foi um agente activo a contribuir para a hecatombe que vitimou todos os portugueses.
     O país não está a produzir o suficiente sequer para pagar os juros da dívida que temos presentemente, uma vez que continuamos por esse mundo à procura de quem nos queira comprar mais uma fatia da dívida mesmo pagando um juro de quase 8,5%. Para já, sabemos que nos próximos 10 anos Portugal terá que pagar 90 mil milhões de euros e em Junho próximo disponibilizaremos 5 mil milhões de euros e resta dizer que a dívida total segundo dizem é de  130 mil milhões de euros porque ao certo ninguém sabe. Acudam-nos,  isto é demasiada areia para a nossa camioneta.
     Se é inevitável a entrada do FMI como fez a Grécia e a Irlanda porque não se pediu ajuda há mais tempo evitando-se assim os juros tão altos? Para aonde ele nos queria levar? Numa das minhas crónicas dizia que a nossa situação se agravaria ainda mais. Pois bem, agora estou mais convicto disso.
      Há dias, o deputado comunista Jerónimo de Sousa dizia numa entrevista que Portugal estava a afundar-se. Concordo plenamente com ele neste aspecto uma vez que a minha convicção é que esta barcaça ainda não bateu com o casco bem no fundo. Quando isso acontecer,  possivelmente as pessoas que representam ainda 30% dos apoiantes deste governo demissionário, é que acordarão dessa letargia mas, possivelmente será um despertar para uma realidade demasiada amarga.
     A partir de agora, abriu-se um novo capítulo mas, desengane-se todo aquele se pensar que só por haver troca de caras ou nova maneira de fazer politica, a situação vai melhorar com um passe mágico porque não será isso infelizmente que irá acontecer. Os que foram agora corridos, deixaram o país demasiado doente e, oxalá que quem vier, o envie para os cuidados intensivos e empregue todos os esforços para não o deixar sucumbir.
     Entretanto o povo, aquele que é sempre vergastado e espoliado, resta-lhe fazer contas à vida e dela mal dizer.  O pior, o que me faz confusão, é que muito deste povo está contido nos tais 30% que apoiam o governo sacudido.
     Estará mesmo certa aquela frase demasiado ouvida que diz que cada povo tem o governo que merece? Se assim é resta-nos cumprir então o nosso fadário.
     E como não podia ser de outra maneira, para todos os que nos meteram neste buraco… REBIMBA O MALHO

Conde da Gardunha