REBIMBA O MALHO

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sexta-feira, 28 de março de 2014

O SUICÍDIO DA ESCRITA

O SUICÍDIO DA ESCRITA

Muitos foram os suicidados da literatura como Séneca, Virgínia Woolf ou Hemingway. Afirmava Jacques Brochier: - Com a morte é banalidade. Porém, com o suicídio, acontece aliado ao desgosto a liberdade. 
A esta filosofia não foram alheios os autores portugueses como Mário de Sá-Carneiro que se envenena num quarto em Paris, Camilo Castelo Branco com um tiro de pistola ou Antero de Quental que, igualmente como Camilo se suicida com um tiro na cabeça num banco de jardim.
Não foram suicídios românticos mas, suicídios de almas atormentadas. Não eram seres banais e comuns,  que estes,  agarram-se à vida incapazes de cortarem amarras dominados pelo instinto da sobrevivência capazes de arrastarem penosamente o sofrimento, sublimados no querer viver a tudo o custo.
Só os melhores, os iluminados, abolem  e dominam a banalidade e de num acto de vontade, sacrificam livremente a sua própria vida. Só o homem superior vive quanto deve e não quanto pode.
Goethe, para sublimar o seu próprio suicídio escreveu: O suicídio é o meu herói!
Antero de Quental nasceu em 1842 na Ilha dos Açores na cidade de Ponta delgada e foi o principal mentor da "Geração de 70" que faziam parte também Ramalho Ortigão, Guerra Junqueiro, Eça de Queirós Conde de Sabugosa, Conde de Ficalho entre outros. Mais tarde, este grupo passou por várias vicissitudes e passou a dominar-se: "Os Vencidos da Vida".
Antero, a quem Eça chamava "O Santo Antero", desde muito cedo na sua escrita começa a reflectir-se, a Solidão, como ilustram bem estes dois versos: "Só busco o teu encontro e o teu abraço / Morte, irmã do Amor e da Verdade".
Sente-se só entre a multidão e que porventura, influenciado pelas ideias politicas e filosóficas da sua época,  leva-o a interrogar-se sobre o destino da sua vida.
Deambula entre consultórios médicos à procura de uma cura para a sua doença quiçá mais imaginária do que real. Atravessa um período doloroso e, pergunta-se muitas vezes "para que vim ao mundo".
Oscilando entre a depressão e a actividade, leva-o a tentar uma acção colectiva que por emergir solitário se refugia em Vida do Conde.
Resolve mais tarde regressar à sua Ilha onde espera acabar na "paz vegetal da terra-mãe". A família não o recebe como esperava e de novo vem a angústia e a depressão.
Antero veste-se de preto, compra uma pistola, faz a última visita a alguns amigos e, sentado num jardim de costas para uma parede onde estava escrita a palavra:- Esperança", desfecha o tiro fatal.
O suicídio de Antero acontece pela ruptura de equilíbrio. Diz ele:- Que é o mundo ante mim? Fumo ondeando visões sem ser, fragmentos de existências... Uma névoa de enganos e impotências sobre vácuo insondável rastejando.
Bonito... Digo eu!
Camilo Castelo Branco que poderia ter por cognome o desventurado por via da sua existência atribulada. Nasceu em Lisboa no ano de 1825.
Devido às contingências da sua vida fê-lo um homem desiludido e amargo, apenas sustentado pelo seu trabalho que era o bordão da sua peregrinação por este mundo.
Homem de amores trágicos como o amor desmedido pela Maria do Adro. Por estar ausente da terra, só soube da sua morte meses depois. Cavalgou dia e noite acicatando as montadas que as revezou pelo caminho. Chegado, correu para a capela onde repousava a sua amada e deitou-se na sepultura com as lágrimas a correrem-lhe pela face transfigurada. Com a conivência de um tio médico a meio da noite desenterraram o cadáver. Camilo viu assim pela última vez o rosto já em decomposição daquela que tinha sido para ele o amor da sua vida.
A mulher que teve depois e que pela qual esteve na prisão, já não a podia suportar. O ferrete do destino adverso está-lhe cravado na alma.
Camilo vai de desgosto em desgosto, de sofrimento em sofrimento, já não sabe o que fazer com o seu filho doido e, a cegueira aproxima-se.
Assim, desesperançado, prevendo o gesto libertador escreve em 22 de Novembro de 1886 um documento que impressiona:
“A minha vida foi tão extraordinariamente infeliz que não podia acabar como a maioria dos desgraçados. Quando se ler este papel, eu estarei gozando a minha primeira hora de repouso. Não deixo nada. Deixo um exemplo”.
Numa carta dirigida ao Dr. Edmundo Magalhães Machado de quem ouvira boas referências numa derradeira tentativa de procurar algo para a cegueira escreve:
“ Sou o cadáver representante de um nome que teve alguma reputação gloriosa neste país, durante quarenta anos de trabalho. Chamo-me Camilo Castelo Branco e estou cego.”
Porém, a sorte estava já delineada, calmo e sereno Camilo sacou do revólver e disparou sobre o parietal direito. A sua vida já não fazia qualquer sentido para continuação da sua obra.
Nasce em 1890 Mário Sá-Carneiro. No livro “Confissões de Lúcio” escreveu:
“Depois, não me saciam apenas as coisas que possuo, aborrecem-me também as que não tenho, porque, na vida como nos sonhos, são sempre as mesmas. …………….. Gastar o tempo é hoje o único fim da minha existência. Sou um inconstante! Quem tiver a vontade de ler a sua obra, verificará que a mania do suicídio é uma obsessão.
Mário Sá-Carneiro é uma pessoa de uma sensibilidade extrema e doentia. Nasceu não para viver mas para suportar a vida. È uma criatura à parte.
Nas últimas horas, fala de si com desprezo, cinismo mas, também com altivez rejeitando a humanidade, transcende-se a si mesmo.
Fecha-se no seu quarto de Paris, veste o smoking e parte para a viagem derradeira.



CONDE DA GARDUNHA

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